sábado, 24 de dezembro de 2011

Partido Social da Discriminação?








No fim do mês de novembro o Partido Social Cristão (PSC) publicou o seu 24º informativo, com oito páginas que trazem as principais notícias sobre suas conquistas e projetos em andamento, envolvendo seus candidatos para as próximas eleições, seus senadores e deputados em atuação. A matéria de capa é intitulada “Em defesa da família – PSC lança campanha de promoção dos valores familiares” e inicia mostrando os seguintes dados de sua propaganda eleitoral: “Ao todo, foram veiculados, em rede nacional de rádio e televisão, 40 inserções de 30 segundos e um programa partidário de dez minutos, entre os dias 13 e 27 de outubro. Neles, o PSC destacou suas ideias, bandeiras e propostas”.

Nas propagandas, entre algumas falas de candidatos, foi inserida uma vinheta em que uma criança diz “Homem + Mulher + Amor = Família”, enquanto a frase também aparece em tons verdes na tela. Os comerciais geraram polêmica em função desse ideal, no qual a definição de família é restrita a apenas três elementos imutáveis, e, por isso, no editorial do informativo do PSC, o vice-presidente do partido, Everaldo Pereira, esclareceu a frase dizendo “Sabemos que essa não é a única equação possível: Avô + Neto + Amor = Família; Mãe + Filho + Amor = Família; e muitas outras. Mas o PSC reafirma que somente a união entre homens e mulheres torna possível a existência da humanidade, e por isso, vamos sempre trabalhar em defesa da família nuclear, base da sociedade e da perpetuação da raça humana”. Será mesmo que a humanidade só é possível caso a família seja constituída da união entre um casal heterossexual? Será que as técnicas de reprodução assistida já não são uma prova de que a ciência evoluiu o bastante para que essa união não seja obrigatória para que a humanidade não corra o risco de entrar em extinção? E que humanidade seria essa que o PSC propõe, onde está o fator humanístico nessa proposta excludente? É neste ponto que podemos ver que o maior defeito do ser humano é não ser humano o suficiente.

Somente por esse trecho do editorial, o significado da sigla do partido deveria ser “Preconceito Social Cristão”. O PSC discrimina claramente os homossexuais, considerando que é impossível uma união entre pessoas do mesmo sexo gerar uma entidade familiar e, por isso, estão tentando aprovar leis que tiram os direitos que essa classe vem conquistando. Um exemplo dessa tentativa é o Projeto de Lei 7018/2010, proposto pelo deputado Zequinha Marinho (PA), que visa proibir a adoção de crianças por casais homossexuais.

Será mesmo que as crianças que estão em orfanatos preferem ali continuar a terem uma família constituída pelo afeto de dois pais ou duas mães? O deputado Zequinha considera que “Apenas homens e mulheres formam uma verdadeira família. Crianças em adoção não podem sair de uma situação de dificuldade para entrar em outra”. Entretanto, há estudos jurídicos considerados pela primeira desembargadora mulher do estado do Rio Grande do Sul, Maria Berenice Dias, que mostram que o conceito de família mudou e ele está muito mais ligado ao afeto do que à organização da entidade familiar. Se os indivíduos mudaram, acompanhando as transformações sociais modernas, com a família não seria diferente: novas estruturas surgem, além dos elementos tradicionais equacionados pelo partido. Isso é evolução social. 

O deputado Zequinha tenta argumentar que “O ser humano é produto do meio. Se uma criança for criada por um casal homossexual, certamente isso terá influência, futuramente, na sua opção sexual”. Ele está totalmente equivocado. Em primeiro lugar, ninguém opta por ser homo ou heterossexual: a sexualidade é uma condição imposta a todo ser vivo animal, logo, não pode ser escolhida. Em segundo lugar, se a sexualidade dos pais influenciasse na dos seus filhos, nenhum ser humano seria homossexual, partindo do princípio que a primeira geração humana começou com o envolvimento entre pessoas de sexos diferentes.

Na matéria de capa do informativo, o PSC afirma que eles não se baseiam apenas em preceitos cristãos para construírem seus argumentos, mas levam também em consideração a ciência que, de acordo com eles “prova que se não fosse a combinação de homem + mulher a espécie humana simplesmente não existiria”. Entretanto, essa “combinação” apenas se fazia necessária há séculos atrás, quando a própria ciência ainda não havia encontrado outras formas de fertilização sem o contato direto entre homem e mulher, como a inseminação artificial, por exemplo.

Ora, é óbvio que o PSC tem como base constitucional e argumentativa os preceitos clérigos. Eles mostram isso abertamente no seu estatuto, dizendo que o partido “tem como fundamento a Doutrina Social Cristã, onde o Cristianismo, mais do que uma religião, representa um estado de espírito que não segrega, não exclui, nem discrimina, mas que aceita a todos, independentemente de credo, cor, raça, ideologia, sexo, condição social, política, econômica ou financeira” e colocando, de acordo com os mesmos, “o ser humano em primeiro lugar”.

O partido de fato não segrega? Não exclui, nem discrimina? Eles realmente colocam o ser humano em primeiro lugar? Eu, como homossexual, sinto-me, sim, excluído por ainda não ter todos os meus direitos assegurados (eu mal poderia alegar que fui vítima de homofobia por ter sido espancado enquanto andava de mãos dadas com meu namorado) e discriminado por ver deputados tentando acabar com os poucos que tenho, como poder adotar um filho e constituir uma família, além de me sentir totalmente segregado à raça humana quando o partido não coloca os direitos de que necessito em primeiro lugar, mas ao contrário: luta contra toda a classe LGBTT.

Todos nós, brasileiros, estamos inseridos em um Estado Laico, sem interferência alguma da igreja para que decisões políticas sejam tomadas. Por que, então, o PSC insiste em se embasar na bíblia para definir o que pode ou não? Se os seus ideais fossem seguidos, estaríamos sujeitos a voltarmos à Santa Inquisição e sermos perseguidos por termos opiniões contrárias. A democracia deixaria de existir e uma ditadura se instalaria. Além disso, se levarmos esses embasamentos ao pé da letra podemos entender que o partido acredita no criacionismo, logo, que Deus criou o homem e a mulher e que descendemos destes dois indivíduos, portanto acreditam que seríamos produto de uma série de incestos, tanto desses primeiros indivíduos, como de seus filhos e assim sucessivamente.

Eu e, provavelmente, todos homossexuais estamos cansados de sermos inferiorizados, de ter medo de sermos espancados, e sermos tratados de forma diferente perante a lei - que, apesar de tudo, em seu quinto artigo da constituição afirma que todos nós somos iguais diante dela -, em justificativa de ideais preconceituosos como os do PSC. O partido precisa reavaliar os seus conceitos, argumentos e ideais, pois eles discriminam seres humanos, contradizendo, portanto, os princípios do próprio partido, que constam em seu estatuto e violando o quinto (e mais importante) artigo da constituição federal.

Phillipp Gripp

Estudante do 4º semestre de Jornalismo
Fundação Universidade Federal do Pampa
Unipampa - São Borja

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